Direito e Tecnologia: A Utilização da IA pelos Tribunais
- airtondantasadv
- 12 de set. de 2024
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A interseção entre o direito e a tecnologia tem proporcionado avanços significativos na forma como a justiça é administrada em todo o mundo. Uma das áreas mais impactadas por essa relação é a utilização da Inteligência Artificial (IA) pelos tribunais. A IA vem sendo adotada em diversas etapas do processo judicial, desde a análise de casos até a tomada de decisões. No entanto, é importante ponderar os pontos positivos e negativos dessa integração e discutir a necessidade de regulamentação.
Entre os pontos positivos da utilização da IA nos tribunais, destaca-se a capacidade de processar e analisar grandes volumes de informações de forma rápida e eficiente. Isso pode contribuir para uma maior celeridade nos processos judiciais, reduzindo a sobrecarga do sistema e garantindo um acesso mais ágil à justiça. Além disso, a IA pode auxiliar na identificação de padrões e tendências, fornecendo insights valiosos para as decisões judiciais.
No entanto, é importante abordar também os desafios e riscos relacionados à adoção da IA no direito. Yuval Harari, autor renomado, expressa preocupações sobre a crescente influência dos algoritmos na tomada de decisões judiciais. Ele argumenta que os algoritmos podem ser programados com base em viéses humanos, o que pode resultar em discriminação algorítmica e perpetuação de injustiças sociais.
A discriminação algorítmica é um dos pontos negativos da evolução tecnológica desenfreada. Os algoritmos podem reproduzir e amplificar preconceitos existentes na sociedade, levando a decisões judiciais enviesadas e injustas. Portanto, é fundamental que sejam implementados mecanismos de auditoria e transparência para garantir que os sistemas de IA utilizados nos tribunais sejam justos e imparciais.
Sugiro aos interessados no tema a pesquisa e a visita aos sites das Startaups Faception e Corsingt AI para entender um pouco sobre as preocupações sobre a possibilidade de discriminação algorítmica e perpetuação de injustiças sociais.
No contexto brasileiro e global, a falta de regulamentação específica sobre a utilização da IA nos tribunais é uma questão relevante. Países como Canadá, França e Reino Unido já adotaram legislações voltadas para a ética e responsabilidade algorítmica. Essas regulamentações estabelecem diretrizes claras para o uso da IA no setor jurídico, visando mitigar riscos, promover a transparência e garantir a justiça.
No Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm utilizado sistemas de inteligência artificial para auxiliar na análise de processos, como a classificação automática de recursos e a identificação de temas relevantes em documentos judiciais.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) também tem utilizado IA para aprimorar suas atividades, como na detecção de notícias falsas e na análise de informações para subsidiar as decisões eleitorais. Já o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) lançou em 2020 o projeto “Inteligência Artificial no Judiciário Potiguar” com o objetivo de utilizar IA para agilizar processos e facilitar a pesquisa jurisprudencial.
A Advocacia-Geral da União (AGU) utiliza uma plataforma de inteligência artificial chamada Victor Hugo, desenvolvida internamente. A IA foi projetada para auxiliar a AGU em suas atividades jurídicas oferecendo recursos como análise automatizada de processos, pesquisa de jurisprudência, elaboração de peças processuais e identificação de precedentes relevantes, fornecendo informações e auxiliando na tomada de decisões jurídicas.
É certo que a tecnologia traz diversos avanços e otimiza o fluxo de tratamento dos processos, permitindo maior celeridade na tramitação. No entanto, ainda há um longo caminho a se percorrer no Brasil e em outros países. É necessário um debate amplo e aprofundado sobre o tema, envolvendo especialistas em direito, tecnologia e ética. A criação de regulamentações apropriadas deve levar em consideração as particularidades do sistema jurídico de cada país, buscando encontrar um equilíbrio entre a eficiência proporcionada pela IA e a preservação dos princípios fundamentais do direito.
Assim, a utilização da IA pelos tribunais traz consigo benefícios e desafios. A tecnologia pode agilizar os processos judiciais, mas também demanda uma análise crítica para evitar discriminações algorítmicas. A necessidade de regulação é evidente, especialmente à luz dos países que já estão implementando medidas nesse sentido.
Como já acima anunciado, o Canadá aprovou a Lei de Tomada de Decisões Éticas por Inteligência Artificial, estabelecendo princípios éticos para o uso de IA em processos decisórios, incluindo os judiciais. Na França, a Lei de Orientação e Regulamentação das Decisões Públicas Assistidas por Computador aborda a transparência e a responsabilidade dos sistemas algorítmicos no setor público, o que impacta também o âmbito judicial. Já o Reino Unido desenvolveu diretrizes para o uso da IA nos tribunais, com foco na necessidade de explicabilidade e justiça.
O que proponho nesse texto é a reflexão sobre a complexidade do tema e a necessidade de se regular, todavia, sem podar o desenvolvimento tecnológico. O Brasil, por sua vez, ainda carece de uma regulamentação específica sobre a utilização da IA no direito. Embora a Lei Geral de Proteção de Dados ( LGPD) aborde a proteção de informações pessoais, é necessário um marco legal mais abrangente que trate das questões éticas, da transparência e da responsabilidade no uso da IA nos tribunais e pelos operadores do direito em geral. É fundamental envolver todos os atores relevantes, incluindo os órgãos do Poder Judiciário, Ministério Público, Advocacia, especialistas em direito e tecnologia, além da sociedade civil, para estabelecer diretrizes claras e garantir que a IA seja utilizada de maneira ética e equitativa.
Nesse sentido, é importante destacar a importância da formação e atualização dos profissionais do direito em relação aos avanços tecnológicos. A compreensão dos impactos da IA no sistema judicial e a capacidade de lidar com os desafios e oportunidades que surgem são essenciais para garantir a justiça e a igualdade perante a lei.
Em conclusão, a utilização da IA pelos tribunais e pelos demais operadores do direito representa uma transformação significativa no campo do direito. Embora ofereça benefícios como agilidade e insights valiosos, é crucial lidar com os desafios, como a discriminação algorítmica e outros temas de desafios éticos que se avizinham. A regulamentação adequada se faz necessária para garantir a transparência, a ética e a responsabilidade no uso da IA no sistema jurídico. O exemplo de países que já estão à frente nesse aspecto pode servir como referência para o desenvolvimento de um marco legal adequado no Brasil e em outros lugares do mundo. Somente com uma abordagem cuidadosa e colaborativa podemos aproveitar plenamente os benefícios da tecnologia, preservando os princípios fundamentais da Justiça e do Estado Democrático de Direito.
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